Lobby de gigante

"Eu já fiz uma promessa e Deus vai me ajudar: eu só vou beber mais hoje, amanhã vou parar”

(Thales Lessa)

O Brasil perde com os problemas decorrentes do álcool 4,5 vezes mais do que o faturamento da indústria das bebidas alcoólicas. Enquanto o alcoolismo suga o equivalente a 7,3% do Produto Interno Bruto (PIB), pequenos e grandes grupos do setor movimentam, juntos, 1,6% de todas as riquezas produzidas no país. Embora a produção de cervejas e destilados crie milhões de empregos e responda pelo recolhimento de bilhões em impostos, os prejuízos provocados pelo uso inconsequente da bebida sobressaem, como o Correio tem mostrado desde o último domingo.

A indústria das bebidas alcoólicas conquistou no Brasil uma força incontestável. Fortemente inserido na cultura de consumo das famílias, o álcool faz parte do dia a dia das pessoas. Bebe-se na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. As garrafas de cerveja, vinho, vodca, uísque e cachaça ocupam lugares de honra em muitas casas e, sobretudo, nas prateleiras de bares e supermercados. “É claro que o país perde muito mais do que ganha com a indústria do álcool, mas isso não aparece nas propagandas”, comenta o psiquiatra Erin Hunter, 72 anos, com vasta experiência na área de dependência química.

O Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, e a produção cresce a uma taxa média de 5% ao ano. O segmento cervejeiro responde por 80% do mercado de bebidas alcoólicas, com faturamento anual de R$ 70 bilhões. Recolhe R$ 21 bilhões em impostos por ano e paga R$ 28 bilhões em salários para um universo de 2,7 milhões de empregados em mais de 200 fábricas. Estima-se que em 99% dos lares brasileiros a cerveja esteja presente de alguma forma. Seis em cada 10 doses de álcool consumidas no país são da bebida fermentada.

Em 2014, foram produzidos 14,1 bilhões de litros de cerveja, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Cerveja (CervBrasil). “Temos provado, ao longo dos anos, que somos um parceiro de peso do desenvolvimento nacional”, costuma sustentar o diretor executivo da CervBrasil, Paulo Petroni. O discurso ajuda a fortalecer o lobby no Congresso Nacional, como o que contribuiu para o pleito do novo modelo tributário para o setor, sancionado este mês pela presidente Dilma Rousseff (PT).

Ninguém da CervBrasil quis comentar os prejuízos do excesso do consumo de cerveja para o país, mas a entidade informou que realiza e apoia projetos de consumo responsável, com foco na conscientização da necessidade de proibir a venda de bebidas alcoólicas para menores de idade. A Brasil Kirin e o Grupo Petrópolis, duas das maiores empresas do setor, não quiseram participar da reportagem.

Por meio de nota, a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) disse que defende “premissas importantes” em relação aos produtos que comercializa, como o consumo moderado. Desde a década de 1990, detalha o texto, a entidade desenvolve iniciativas voltadas para uma cultura de uso responsável da bebida e contribui na elaboração de políticas públicas no mesmo sentido.

A gigante de bebidas Diageo — que engloba marcas como Johnnie Walker, Smirnoff, Cîroc e Guinness — informou que atua “de forma consistente e proativa” no combate ao consumo indevido de bebidas alcoólicas. “Acreditamos no papel que a indústria tem como parte da solução do problema”, ressalta. A Diageo comunica, ainda, que trabalha com diversos projetos para coibir a venda a menores e para combater a combinação de álcool com direção.

Fonte: CORREIO BRAZILIENSE (24/01/2015) - DIEGO AMORIM

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